
Cinco de Novembro
Você que consegue romper as procelas.Que chega de repente no topo e para tudo, como um Deus que eu inventei por culpa da pós-modernidade e das luzes McDonalds.Você que se apaixona sôfrego e dissoluto.Você que fica mudo quando eu falo Nada. Que tem raízes animal que te ponham em pé em meio à multidão. E dilacera o meu vestido e constrange meus sentidos, perturba minha vista.Você que insiste para que eu quebre meu pacto com a razão.Que tem uma certa razão nas suas propostas sonâmbulas e embriagadas.Você que chora e molha por um bem que te atormenta, que inventa palavras para os momentos.Você que não sabe o quanto me cabe no peito, o quanto de você mora aqui por usucapião.
Você que tem gosto de bala de café tem fé na estrada e pé em Deus, que quer ser cavalheiro quando está com sono, que me deixa virar as costas e faz-se de mudo.Você que nulo deixou a última questão.Você que não consegue engolir todo o whisky, que leva no bolso o meu vício, mas não trás a cura.Você que segura minha mão gelada no labirinto para que eu não me perca.Que leva minhas mãos e a certeza.Protege minhas dúvidas atrás das costas e guarda meus segredos numa pasta.Você que não crê em destino e nem em graça, que como traça me rói os tecidos. Você que não comigo, mas com outra é rei.Você que eu aturei lamúrias e desacatos.Você homem, bicho do mato, você come, eu prato! Você que some quando as portas vão se fechar.Que consome a vida na segurança da minha previsibilidade.Você que bate, fere, machuca.Que assopra e bota açúcar. Que mente, que sente, que segue e me manda por o cinto. Você por quem eu não sei o que sinto, nem o que eu acho.Você que esconde os nomes e as frases feitas, afoitas. Que diz que eu dou sorte e dou azar. Você que diz querer ficar quando está indo.Que olha sorrindo e finge de repente.Você que é homem e sempre dissolve na multidão.Que arranca gemidos alheios pra que eu ouça.Você que me faz frio no verão, que me faz saia e salto fino.Você que faz filhos com o seu grande amor, faz planos para eles comigo. Você que me é amigo, você que oscila em entediado e sem assunto.Você que aceita minha indiferença por orgulho, que quer morar no interior, cachorros, filhos e casa.Você que casa, eu que mudo.Você que fala acha chato, eu estranho.Você pondo panos quentes, eu queimando.Você dizendo que tem que ir. Eu deixando por não saber o que dizer.Você indo, rindo, parecendo feliz. Eu tomando whisky com guaraná na zona.Você indo, vindo com o novo. Eu vendo chuva na alameda Pamaris.Você indo, abrindo a porta do carro, eu correndo com pernas imaginárias, com pressa disfarçada no borrão da maquiagem.Você, sobre as rodas, eu ficando na estação.Você, mandando um telegrama de que no fundo eu não sou tão ruim, Eu fazendo poeminhas para acreditar.Você, garoto interrompido, cumprindo suas teses de macho, eu garota reprimida, machucando a pele do rosto.Você, moço...Eu maço de cigarros!Vem dançar comigo, não agüento mais dar passos tão perdidos!
Foto: Yves
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